Arrendamento rural
INTRODUÇÃO. O contrato nasceu com a vida em sociedade. A partir do momento em que duas ou mais pessoas decidiram ocupar o mesmo espaço, fez-se necessário a celebração de um pacto de convivência que disciplinasse tal mister, com o propósito de minimizar o surgimento de conflitos ou de solucioná-los, na hipótese de não se poder inibi-los.
Essa é a gênese do contrato, desenvolvida ao longo dos anos, no compasso das mudanças operadas no tecido social.
Segundo Cláudia Lima Marques, “a idéia de contrato vem sendo moldada desde os romanos, tendo sempre como base as práticas sociais, a moral e o modelo econômico da época. O contrato, por assim dizer, nasceu da realidade social” (1) .
O professor Arnoldo Wald tem um entendimento parecido. Para ele, “poucos institutos sobreviveram, por tanto tempo, e se desenvolveram sob formas tão diversas quanto o contrato, que se adaptou a sociedades com estruturas e escalas de valores tão distintas quanto as que existiam na Antigüidade, na Idade Média, no mundo capitalista e no próprio regime comunista” (2) .
O arrendamento rural, como modalidade de contrato agrário e subespécie de contrato que é, seguirá exatamente a trajetória genérica dos contratos em geral, com suas evidentes nuances, o que se poderá perceber no desenvolvimento da presente reflexão.
O presente trabalho será dividido em três capítulos, abrangendo três dentre as diversas formas de tratamento recebidas pelos contratos em geral e, entre eles, o contrato agrário de arrendamento, ao longo da história da humanidade, visando não somente o estabelecimento de uma linha histórica de raciocínio, mas também uma melhor compreensão da temática desenvolvida.
No primeiro capítulo será apresentada a forma clássica, caracterizada pela predominância do rito sobre a forma, vigente desde os primórdios da Antigüidade até 1804, quando entrou em vigor, na França, o Código Napoleônico.
No segundo capítulo, dar-se-á tratamento ao tema à luz do Code des Français, em que cuja tela se inspirou o Código Brasileiro de Beviláqua, datado de 1916, onde se verá o predomínio quase absoluto da autonomia da vontade.
Por último, tratar-se-á da concepção adotada pela legislação específica que atualmente cuida da matéria, em especial o Estatuto da Terra (Lei 4.504/64) e seu Regulamento (Decreto nº. 59.566/66), complementado pelas idéias de Miguel Reale, presentes no atual Código Civil (Lei 10.406/02), nas quais o contrato é condicionado pelo cumprimento da função social.
CAPÍTULO 1 - A CONCEPÇÃO CLÁSSICA DO CONTRATO
Os contratos agrários constituem subespécie dos contratos em geral. Destarte, desde a
Antigüidade, até a vigência do Code Civil des Français (Código Civil dos franceses), aqueles foram celebrados da mesma forma que estes. Não havia nenhuma singularidade para aquela espécie de contrato.
Volte-se ao Império Romano, onde basicamente se originou o Direito. Destaque-se que seus contratos regiam-se, em princípio, pela forma, ou seja, pela observância do rito ou do sacramento. Nem todo pacto ou convenção era considerado como contrato. Como tal, reconheciam apenas aqueles que observassem o rol de formalidades estabelecidas. O contrato era, portanto, um ato formalístico, por excelência.
É nesse sentido o pensamento de Sílvio Venosa (3) . Segundo ele, No Direito Romano primitivo, os contratos, como todo os atos jurídicos, tinham caráter rigoroso e sacramental. As formas deveriam ser obedecidas, ainda que não expressassem exatamente a vontade das partes. Na época da Lei das XII Tábuas, a intenção das partes estava materializada nas palavras corretamente pronunciadas.
O arrendamento, no Direito Romano, surge numa etapa posterior, como modalidade de contrato consensual, mas, ainda baseado em rituais. A normatização escrita para a sua formalização vai surgir somente com o Ius Civilis do Imperador Justiniano. Todavia, nem mesmo o Codex, conseguiu fazer com que a teoria suplantasse a prática. Ainda que estivesse revestido das formalidades codificadas, e, teoricamente, caracterizado como uma obrigação, na prática, a vontade das partes ainda ficava em segundo plano. Conforme destaca Sílvio Venosa, “à parte prejudicada não bastava provar a existência do contrato; devia provar que cumprira uma prestação.” (op. cit., p. 395). Jogo de palavras à parte, se a parte não tivesse feito a sua parte, seu contrato de nada serviria para obrigar a outra parte.
A imposição da vontade sobre a forma, no Direito Romano, somente foi conquistada com o passar do tempo, a partir do aperfeiçoamento da codificação e da ampliação, cada vez mais significativa, do número de cláusulas vinculantes nos contratos, permanecendo vigente até a queda do domínio romano no ocidente, aproximadamente em 476, A. D.. A partir dalí, foi substituída pelo simbolismo germânico o qual perdurou até a Alta Idade Média (4) , por volta do ano 1000 A.D., e que ainda exigia a realização de um ritual para o nascimento da obrigação.
A volta às idéias romanas ganha novo ânimo a partir da Idade Média Clássica, com a influência da Igreja e o renascimento dos estudos romanos enfatizando a obrigatoriedade da traditio cartae, ou seja, a necessidade de entrega de um documento relacionado com a obrigação convencionada.
Em síntese, pode-se dizer que, desde a Antigüidade mais remota até o final da Idade Média, teve-se o predomínio do rito sobre a forma no que concernia ao estabelecimento das obrigações contratuais.
CAPÍTULO 2 - A CONCEPÇÃO DO CÓDIGO FRANCÊS
A concepção presente no Code des Français baseia-se no predomínio da autonomia da vontade sobre a forma, no estabelecimento das obrigações contratuais. Teve seu nascedouro no final do Império Romano do Ocidente, a partir do momento em que houve nos contratos uma significativa ampliação no que dizia respeito à quantidade de cláusulas vinculantes. Desapareceu com a queda daquele Império, quando foi substituído pelo simbolismo germânico, que ainda pregava a necessidade de um ritual para o estabelecimento da obrigação, retornando, gradativamente, ao quotidiano contratual durante a Idade Média Clássica e Baixa Idade Média, principalmente em função da influência religiosa e do renascimento dos estudos romanos.
Para a Igreja palavra e o juramento deveriam prevalecer sobre qualquer outra forma de decisão. A palavra era a lei.
Por outro lado, a Baixa Idade Média presenciou o renascimento dos estudos das antiguidades romanas, onde havia sido desenvolvida a relação jurídica consensual, com o predomínio da autonomia da vontade sobre a forma.
Além disso, foi também desenvolvida naquele tempo, as idéias a respeito do Direito Natural. Segundo essa teoria, a pessoa humana era a fonte primordial do direito e, portanto, baseado nos dogmas da autonomia da vontade e da liberdade contratual, já afirmados pela Igreja e corroborados pelos estudos romanos, difundiu-se o entendimento de que o ato de contratar somente poderia ser restringido pela própria vontade do homem.
Do somatório de todas essas idéias, consolidou-se, em definitivo, o predomínio da autonomia da vontade no que tangia à formalização dos contratos agrários. Em termos legais, esse conteúdo foi absorvido pelas disposições do Código Napoleônico (5) de 1804.
É de destacar que, embora não tenha sido o primeiro sistema de codificação legal, o Code des Français foi o primeiro a obter sucesso enquanto código. Tinha o mesmo por pretensão consolidar os ideais da Revolução Francesa de 1789, principalmente no tocante à liberdade para explorar a propriedade da forma que cada proprietário julgasse conveniente. Para o legislador francês, a propriedade era entendida como um direito anterior à sociedade, absoluto e individualista, tendo o dono estatuto de soberania plena sobre os bens móveis e imóveis, estendido inclusive sobre o restante da sua família. O próprio matrimônio foi entendido como um negócio (un affaire d´argent), sendo submetido à lógica dos contratos e à regência dos notários (6) .
Destarte, como consectário dessa forma de pensamento, ficou estabelecido no art. 1.134 do Code, o seguinte texto: Art. 1.134. As convenções feitas nos contratos formam para as partes uma regra à qual devem se submeter como à própria lei.
O Código Francês influenciou de forma decisiva a legislação relativa à propriedade e aos contratos em todo o mundo. O Código de Beviláqua foi um dos tantos que se inspiraram em seus ideais, principalmente porque o Brasil de 1916 era formado por uma sociedade tipicamente agrária, caracterizado pela existência de grandes propriedades rurais.
Assim registra Felipe Dall’Alba(7): O Brasil, na época que antecede a elaboração do Código, possuía uma população essencialmente agrícola, que, em 1872, era de 9.930.478 habitantes, sendo que um milhão e meio eram escravos, um milhão de índios e cinco milhões de agregados em fazendas e engenhos e trezentas ou quatrocentas mil pessoas pertenciam às famílias de proprietários de escravos, os fazendeiros, os senhores de engenho.
Vigorava a política dos fazendeiros e senhores de engenho, tanto na regência da economia, quanto na elaboração das leis que deveriam ser obedecidas por todos. Embora os ofícios públicos, inclusive os espaços políticos fossem, em muitos casos ocupados pela classe média, isso somente se dava por conta da permissão e apadrinhamento feita pelos grandes proprietários das terras brasileiras. De forma que não era a vontade desses agentes que prevalecia, mas sim a de seus comandantes indiretos. Vigorava a política do cabresto tanto para eleger, como para comandar o eleito.
É nesse sentido o registro de Guerreiro Ramos (8) , segundo a qual, o Código Civil de 1916: No plano político, insta ressaltar que os cargos ocupados pela “elite intelectual urbana da classe média” eram apoiados por grandes fazendeiros, os quais, por meio de uma política clientelista “praticamente nomeavam os legisladores e governadores, em farsas eleitorais”.
Destarte, pode-se concluir com Judith Martins Costa (9) , que o Código de 1916, não continha tão-somente “mecanismos técnicos, mais ou menos perfeitos e completos, mas também a filosofia da sociedade burguesa”.
Desse modo, segundo o entendimento dominante, manifestado pelos legisladores, na elaboração dos contratos agrários deveriam prevalecer as regras decididas pela vontade das partes. Na prática, todavia, os contratos eram muito mais de adesão à vontade do dono da terra do que uma decisão das partes contratantes. Não havia uma preocupação quanto ao equilíbrio verdadeiro entre as partes. Fazia-se de contas que havia e pronto.
O arrendamento no Código Civil de 1916 estava previsto para os casos nos casos de tutela, de enfiteuse e usufrutuário. São assim os seguintes artigos: 426, 427, 678, 689 e 724.
No art. 776 há uma previsão indireta para o arrendamento do prédio rústico, quando diz no inciso II: Art. 776. São credores pignoratícios, independentemente de convenção: II - o dono do prédio rústico ou urbano, sobre os bens móveis que o rendeiro ou inquilino tiver guarnecendo o mesmo prédio, pelos alugueres ou rendas.
Já nos art. 1211 a 1215, o CC de 1916 traz uma subseção especial tratando a respeito de disposições especiais referente aos prédios rústicos. A matéria era tratada como locação.
A partir da II Guerra Mundial o Código Civil Brasileiro passou por grandes mudanças, impingidas por uma legislação revolucionária.
A propriedade terra, até então, considerada como absoluta, passa a ser relativizada, exigindo-se que cumprisse a função social. Dentre todas, com certeza a maior inovação foi a edição do Estatuto da Terra, o qual passou a regular, de forma específica “os direitos e obrigações concernentes aos bens e imóveis rurais”, conforme consta de seu art. Inicial, inaugurando uma nova era para os contratos agrários no Brasil, com evidência para o arrendamento rural e a parceria agrícola.
Apesar de tudo, o Código Civil ainda continua sendo aplicado em relação aos contratos agrários. Todavia, não mais em caráter absoluto, mas apenas como forma de solucionar os casos omissos, conforme ficou estabelecido no art. 92, § 9º., do Estatuto da Terra.
Com a legislação inovadora do Estatuto da Terra, tem-se início um novo capítulo na história dos contratos agrários no Brasil.
É de se de concluir, por conseguinte, que, a regência dos contratos agrários durante a vigência do Código Civil de 1916 foi marcada de forma característica pelo predomínio da autonomia da vontade, pelo princípio do pacta sunt servanda, principalmente em decorrência das influências do Código Francês de Napoleão e da realidade brasileira, marcada pelo predomínio de uma sociedade tipicamente agrária.
CAPÍTULO 3 - A CONCEPÇÃO DO ESTATUTO DA TERRA (ET)
Atualmente, os contratos de arrendamento rural são regidos pelo Estatuto da Terra e suas normas regulamentares, além de contar, em caráter supletivo com as normas do Código Civil para disciplinar os casos omissos. Com objetivo de se obter uma melhor compreensão da temática em estudo, far-se-á uma abordagem geral da legislação aplicada, seguida de uma análise das generalidades pertinentes ao contrato de arrendamento.
3.1. ABORDAGEM GERAL LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
O ano de 1964 vai marcar o início de uma nova era para os contratos agrários, a partir da entrada em vigor do Estatuto da Terra, aprovado pela Lei nº. 4.504, de 30 de novembro de 1964. O Código Civil, doravante, por disposição expressa no § 9º., art. 92, do próprio estatuto novel, somente será aplicado para a solução dos caos omissos.
É de destacar que a nova legislação está embasada no compasso da função social. Não se tem a terra apenas para se ter propriedade, mas para fazê-la produtiva, de forma a assegurar a sua utilidade para todo o conjunto social.
Segundo Antonio Borges (10) : O sentimento de função social da propriedade rural, embora não fosse descoberto antigamente como terminologia científica e jurídica, já estava embutido na consciência das comunidades antigas como sendo a própria necessidade de produzir alimentos.
Além disso, de acordo com o art. 2º., do ET, o acesso à terra está disponível para todos. Não sem qualquer controle, mas de forma relativizada, ou seja, desde que se cumpra a função social. No § 1º, desse artigo, são estabelecidos quatro requisitos para que se possa considerar atingida a função social, quais sejam: a) favorecer o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias; b) manter níveis satisfatórios de produtividade; c) assegurar a conservação dos recursos naturais; d) observar as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os que a possuem e a cultivem.
Quanto ao arrendamento rural, o ET vai tratar de sua normatização nos seus arts. 92 a 95. Já a regulamentação dos dispositivos legais da Lei 4.504/64 veio, por meio de diversos decretos, entre os quais se destaca o Decreto nº. 59.666/66, onde são explicitadas as normas pertinentes ao contrato de arrendamento, notadamente nos seus arts. 16 a 33.
No desenvolvimento desse capítulo ter-se-á como objetivo explicitar os principais elementos do contrato de arrendamento, nos termos da legislação supracitada e suas respectivas alterações, adotando-se, para tanto, como didática, a distribuição em tópicos, visando obter melhores resultados no tocante à compreensão global.
3.2. ANÁLISE DAS GENERALIDADES DO ARRENDAMENTO RURAL
3.2.1. Conceitos. O art. 3º., do Decreto nº. 59.666/66, que regulamentou o Estatuto da Terra, traz os conceitos de arrendamento, subarrendamento e arrendador, os quais são os seguintes:
3.2.1.1. Arrendamento rural é o contrato agrário pelo qual uma pessoa se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de imóvel rural, parte ou partes do mesmo, incluindo, ou não, outros bens, benfeitorias e ou facilidades, com o objetivo de nele ser exercida atividade de exploração agrícola, pecuária, agro-industrial, extrativa ou mista, mediante, certa retribuição ou aluguel , observados os limites percentuais da Lei.
3.2.1.2. Subarrendamento é o contrato pelo qual o Arrendatário transfere a outrem, no todo ou em parte, os direitos e obrigações do seu contrato de arrendamento.
3.2.2. Forma. O contrato de arrendamento pode ser firmado verbalmente ou por escrito. O ET fala em seu art. 92, que o contrato de arrendamento pode ser expresso ou tácito. Na verdade é mais uma “anomalia”, como diz Benedito Marques, uma vez que o que realmente se queria dizer é que a forma do contrato pode ser a “escrita” ou a “verbal”. É esse o entendimento que se verifica no decreto regulamentador, notadamente, nos arts. 54 e 59.
3.2.3. Natureza jurídica. A doutrina classifica o contrato de arrendamento como sendo um contrato bilateral, oneroso, consensual e não solene. A bilateralidade se verifica no fato de que ambas as partes envolvidas assumem obrigações recíprocas no cumprimento do contrato; a onerososidade está caracterizada pelo fato de que também ambas as partes suportam a redução patrimonial, no caso de descumprimento do contrato; já a consensualidade se verifica a partir do momento em que a perfeição do contrato não depende da entrega efetiva da coisa para validá-lo, bastando tão somente o acordo de vontades; e, a não-solenidade se verifica pela inexigência de uma forma especial para a sua celebração.
3.2.4. Vantagens e riscos: Tanto umas, quanto outras pertencem ao arrendatário. Ao arrendador cabe o direito de receber o aluguel, sem nenhum risco de frustração do empreendimento.
3.2.5. Crédito. As partes do contrato de arrendamento podem recorrer às linhas de crédito oficial para viabilizar o objeto contratual, desde que explorem o imóvel rural de conformidade com as exigências mínimas estabelecidas na legislação agrária. É de destacar que a primeira operação financeira poderá ser realizada, mesmo que os interessados não satisfaçam as exigências.
3.2.5.1. Penhor. Dentre as formas de crédito, o arrendatário poderá fazer empréstimos sob penhor agrícola ou animal. Para o primeiro, segundo o art. 52, sendo o contrato celebrado por escrito, nem mesmo haverá a necessidade de “anuência do arrendador” para que a operação financeira se concretize. Já nos contratos verbais, exige-se o seu consentimento. Normalmente, o prazo do penhor não poderá ultrapassar o termo conclusivo do contrato, mas, excepcionalmente, com a concordância do arrendador, será possível a ultrapassagem desse limite temporal. É igualmente indispensável o consentimento de que trata este artigo, se o prazo do contrato de arrendamento, ainda que acrescido de sua possível dilação em virtude de frustração de safra, for inferior ao estabelecido para o financiamento.
No empréstimo sob penhor de animais haverá a dispensa do consentimento, se o contrato respectivo estiver devidamente transcrito no Registro de Imóveis. Nas demais situações exigem-se a anuência.
3.2.6. Registro. O registro dos contratos não é obrigatório para ter validade entre as partes contratantes. Não há qualquer menção sobre isso na legislação agrária. Como o Código Civil deve ser aplicado quando houver omissão, pode-se dizer, por conseguinte que, de acordo com o art. 221 do CC/2002, para os contratos produzirem efeitos em face de terceiros, deverão estar devidamente registrados no registro público.
Além disso, o Registro trará o benefício da dispensa de consentimento por parte do arrendador, quando da realização de empréstimo sob penhor de animais, conforme entendimento primário do art. 58 do Regulamento Agrário.
Já no INCRA, o registro do contrato é obrigatório. Somente será expedido o Certificado de Uso Temporário da Terra para os contratos registrados. Esse Certificado será exigido para a obtenção de financiamentos públicos.
3.2.7. Meios de prova. Os contratos verbais serão provados por meio de declaração escrita do arrendador ou por meio de duas testemunhas. Os escritos, por meio do próprio contrato, quando entre as partes contratantes e, por este devidamente registrado, quando em face de terceiros.
3.2.8. Controle e fiscalização. Cabe ao INCRA o cadastro, o controle e a fiscalização do cumprimento dos contratos de arrendamento, principalmente no tocante às cláusulas obrigatórias.
3.2.9. Analogia. Na hipótese de ser necessário o uso da analogia para interpretar as disposições do contrato de arrendamento, serão aplicadas as normas referente às locações.
3.2.10. Elementos Essenciais do contrato. Como em todo contrato, ao se elaborar um contrato agrário, existem certos elementos que não podem faltar, sob pena de descaracterizá-lo. Desse modo, sem prejuízo do estabelecimento de “outras estipulações” que as partes venham julgar “convenientes aos seus interesses”, o art. 12 do Decreto Nº. 59.666/66 alinhava os principais elementos que devem estar contidos no contrato de arrendamento rural. São os seguintes: lugar e data da assinatura do contrato; nome completo e endereço dos contratantes; características do arrendador (espécie, capital registrado e data da constituição), se pessoa jurídica, e, tipo e número de registro do documento de identidade, nacionalidade e estado civil, se pessoa física e sua qualidade (proprietário, usufrutuário, usuário ou possuidor); característica do arrendatário, ou seja, se o mesmo é pessoa física ou conjunto familiar; objeto do contrato, o tipo de atividade, de exploração e de destinação do imóvel ou dos bens; identificação do imóvel e número do seu registro no cadastro de imóveis rurais do INCRA (constante do Recibo de entrega da Declaração, do Certificado de Cadastro e do Recibo do Imposto Territorial Rural); descrição da gleba (localização no imóvel, limites e confrontações e área em hectares e fração), enumeração das benfeitorias (inclusive edificações e instalações), dos equipamentos especiais, dos veículos, máquinas, implementos e animais de trabalho e, ainda, dos demais bens e ou facilidades com que concorre o arrendador; prazo de duração, preço do arrendamento, com expressa menção dos modos, formas e épocas desse pagamento; as cláusulas obrigatórias devidamente previstas na legislação; o foro do contrato; e, por último, a assinatura dos contratantes ou de pessoa a seu rogo e de quatro testemunhas idôneas, se os contratantes forem analfabetos ou não poderem assinar.
3.2.11. Cláusulas obrigatórias do contrato. As cláusulas obrigatórias para o contrato de arrendamento vêm enumeradas nas disposições do art. 13 e 95, VI, do Regulamento. Destaca-se que o arrendatário não poderá subarrendar ou emprestar o objeto da contratação sem o expresso consentimento do arrendador.
Além da obrigação de assegurar a conservação dos recursos naturais e a proteção social e econômica dos arrendatários, os contratos devem ter as seguintes cláusulas obrigatórias:
3.2.12. Renúncia de vantagens. Os arrendatários estão proibidos de renunciar aos direitos ou vantagens estabelecidas em Leis ou Regulamentos;
3.2.13. Normas e prazos legais. Com o fim assegurar um bom desenvolvimento do contrato e a conservação dos recursos naturais, as partes deverão observar e cumprir as seguintes condições e prazos mínimos em seus contratos:
3.2.14. Prazos mínimos. Deverão ser observados os seguintes prazos mínimos, quando da celebração dos contratos de arrendamento rural:
3.2.14.1. Lavoura temporária. O prazo mínimo para o arrendamento será de três anos nos casos em que ocorra atividade de exploração de lavoura temporária e ou de pecuária de pequeno e médio porte;
3.2.14.2. Lavoura permanente e pecuária de grande porte. Será no mínimo de cinco anos o contrato de arrendamento em que ocorra atividade de exploração de lavoura permanente e ou de pecuária de grande porte para cria, recria, engorda ou extração de matérias primas de origem animal;
3.2.14.3. Exploração florestal. O prazo mínimo será de sete anos nos casos em que ocorra atividade de exploração florestal;
3.2.15. Normas especiais. Deverão ser observadas, quando couberem, as seguintes normas:
3.2.15.1. Código Florestal. Devem ser observadas as normas estabelecidas pela Lei número 4.771, de 15 de setembro de 1965, que aprovou o Código Florestal e o Decreto 58.016 de 18 de março de 1966, que o regulamentou;
3.2.15.2. Cultivos para exportação. Nas práticas agrícolas destinada à exportação intensiva e extensiva para as diversas zonas típicas do país, devem ser observadas as normas fixadas nos Decretos número 55.891, de 31 de março de 1965 e 56.792 de 26 de agosto de 1965.
3.2.16. Preços e pagamentos. A renda a ser paga ao arrendador, poderá ser pactuada com o arrendatário, mas sempre se observando os limites estabelecidos na legislação. Trata-se aqui, de um caso de proteção do arrendatário. Desse modo, a remuneração não poderá ser superior a quinze por cento do valor cadastral do imóvel, incluído o valor das benfeitorias que entrarem na composição do contrato. Já no caso de arrendamento parcial ou se este recair apenas em glebas selecionadas para fins de exploração intensiva de alta rentabilidade, a remuneração poderá ir até o limite de trinta por cento.
Nos casos de arrendamento da área total do imóvel rural, a um ou mais arrendatários, a soma dos preços de arrendamento não pode ser superior a quinze por cento do valor da terra nua que constar do recibo de pagamento do imposto territorial rural.
Nos casos de arrendamento parcial a um ou mais arrendatários, a soma dos preços de aluguel não poderá exceder a trinta por cento do valor das áreas arrendadas, sendo para tanto considerado como base o valor do hectare declarado e aceito pelo INCRA.
Para se chegar ao preço justo, faz-se necessário avaliar também as áreas não arrendadas e as benfeitorias, de tal sorte que a soma dos valores das áreas arrendadas e não arrendadas não seja superior ao preço máximo de arrendamento da área total do imóvel.
O preço do arrendamento só poderá ser ajustado em quantia fixa de dinheiro, mas o seu pagamento pode ser ajustado para que se faça em dinheiro ou em quantidade de frutos, sendo considerando o valor que for maior valor na época da liquidação, entre o preço do mercado local e o preço mínimo oficial.
3.2.17. Renovação. Fixação de bases para a renovação do contrato. Se o arrendatário, no prazo de seis meses antes do vencimento do contrato não notificar extrajudicialmente o arrendatário de que pretende retomar o imóvel para fazer ele mesmo ou através de ascendente a sua exploração direta, nem tampouco notifica-lo extrajudicialmente de outras propostas de arrendamento do imóvel, o contrato fica automaticamente arrendado pelo mesmo prazo do contrato vincendo. Caso notifique o recebimento de outras propostas, o arrendatário terá a preferência em relação ao estranho, em igualdade de condições.
É de destacar que todas as propostas devem estar devidamente registradas no Registro de Títulos e Documentos. Além disso, somente poderá ser arrendado o imóvel devidamente cadastrado no INCRA.
3.2.18. Causas de extinção e rescisão. São as seguintes:
3.2.18.1. Extinção do contrato. O contrato de arrendamento se extinguirá ao término do prazo contratado ou no da sua renovação; pela retomada do imóvel pelo arrendador; pela aquisição da gleba arrendada, pelo arrendatário; pelo distrato ou rescisão do contrato; pela resolução ou extinção do direito do arrendador; por motivo de força maior, que impossibilite a execução do contrato; por sentença judicial irrecorrível; pela perda do imóvel rural; pela desapropriação, parcial ou total, do imóvel rural; e, por qualquer outra causa prevista em lei.
3.2.18.2. Força maior. Na ocorrência de força maior, da qual resulte a perda total do objeto do contrato, este se terá por extinto, não respondendo qualquer dos contratantes, por perdas e danos.
3.2.18.3. Rescisão. Será facultada a rescisão contratual quando houver o inadimplemento das obrigações assumidas por qualquer das partes, ou a inobservância da cláusula asseguradora dos recursos naturais, ficando a parte inadimplente obrigada a ressarcir a oura das perdas e danos causados.
3.2.19. Direito de permanência. O arrendatário tem o direito de permanecer no imóvel, nos seguintes casos:
3.2.19.1. Benfeitorias. Usando e gozando do imóvel, nos termos do contrato, enquanto o arrendador não indenizá-lo pelas benfeitorias realizadas.
3.2.19.2. Na resolução ou extinção do contrato. Quando ocorrer a resolução ou extinção do direito do arrendador sobre o imóvel rural, ficará garantido ao arrendatário o direito de permanecer nele até o término dos trabalhos que forem necessários à colheita.
3.2.19.3. Na alienação do imóvel. No caso de alienação do imóvel rural ou da instituição de ônus reais sobre ele, os contratos agrários não serão interrompidos, ficando o adquirente ou o beneficiário, sub-rogado nos direitos e obrigações do alienante ou do instituidor do ônus.
3.2.19.4. Na morte do arrendatário. Nos casos em que o arrendatário é o conjunto familiar, a morte do seu chefe não será causa de extinção do contrato, havendo naquele conjunto outra pessoa devidamente qualificada que possa prosseguir na execução do mesmo.
3.2.20. Subarrendamento. No caso de haver subarrendamento, este se extingue de pleno direito com a resolução ou conclusão do contrato, salvo se houver disposição convencional ou legal dispondo em contrário.
3.2.21. Despejo. Quanto ao despejo, este somente será concedido nos casos de término do prazo contratual ou de sua renovação; quando o arrendatário subarrendar, ceder ou emprestar o imóvel rural, no todo ou em parte, sem o prévio e expresso consentimento do arrendador; quando o arrendatário não pagar o aluguel ou renda no prazo convencionado; se o arrendatário, por dolo ou culpa devidamente comprovados, causar dano à gleba arrendada ou ás respectivas colheitas; se o arrendatário mudar a destinação do imóvel rural; quando houver abandono total ou parcial do cultivo; se houver descumprimento das cláusulas obrigatórias do contrato; nos casos autênticos de pedido de retomada em que esta for permitida; e quando o arrendatário infringir obrigado legal, ou cometer infração grave dentre as obrigações contratuais.
3.2.22. Indenização das benfeitorias. Direito e formas de indenização quanto às benfeitorias realizadas, ajustadas no contrato de arrendamento.
3.2.23. Normas de proteção sócio-econômicas. Na celebração dos contratos devem ser observadas as normas que visem à proteção social e econômica dos arrendatários, especialmente aquelas que disponham sobre a concordância do arrendador à solicitação de crédito rural feita pelos arrendatários e ao cumprimento das proibições fixadas referentes à prestação do serviço gratuito pelo, à exclusividade da venda dos frutos ou produtos ao arrendador; à obrigatoriedade do beneficiamento da produção em estabelecimento determinado pelo arrendador; à obrigatoriedade da aquisição de gêneros e utilidades em armazéns ou barracões determinados pelo arrendador.
3.2.24. Objeto do contrato: O objeto do contrato de arrendamento é cessão do uso e do gozo de um imóvel rural, total ou parcialmente, incluindo, ou não, outros bens, benfeitorias e ou facilidades, ao arrendatário, mediante recebimento de aluguel.
3.2.25. Identificação do imóvel. Na identificação deve-se delimitar a área por meio de coordenadas precisas, para evitar futuras confusões. Deve-se citar também o número de registro do imóvel no cadastro do INCRA, destacando que tal registro é de caráter obrigatório. Segundo os arts. 9º e 10 do Regulamento, não é permitido a celebração do contrato de arrendamento em relação a imóveis não cadastrados no INCRA.
3.2.26. Finalidade do contrato. Há que se dizer no contrato qual é a sua finalidade. Esta pode ser o exercício de atividade de exploração agrícola, pecuária, agro-industrial, extrativa ou mista. Pode-se ser bem detalhista na descrição das atividades que poderão ser desenvolvidas pelo arrendatário.
3.2.27. Deveres do arrendador. O art. 40 do Regulamento traz como deveres para o arrendador os seguintes: entregar ao arrendatário o imóvel rural objeto do contrato, na data estabelecida ou segundo os usos e costumes da região; garantir ao arrendatário o uso e gozo do imóvel arrendado, durante todo o prazo do contrato; fazer no imóvel, durante a vigência do contrato, as obras e reparos necessários; pagar as taxas, impostos, foros e toda e qualquer contribuição que incida ou venha incidir sobre o imóvel rural arrendado, se de outro modo não houver convencionado.
É de observar que há liberdade para fazer outras convenções a respeito de deveres para o arrendador. É até mesmo possível pactuar de forma diversa no tocante aos pagamentos previstos no inciso IV do art. 40.
3.2.28. Deveres do arrendatário. São mencionados no art. 41 do Decreto nº. 59.666. Destacam-se: pagar pontualmente o preço do arrendamento, pelo modo, nos prazos e locais ajustados; usar o imóvel rural, conforme o convencionado, ou presumido, e a tratá-lo com o mesmo cuidado como se fosse seu, não podendo mudar sua destinação contratual; levar ao conhecimento do arrendador, imediatamente, qualquer ameaça ou ato de turbação ou esbulho que, contra a sua posse vier a sofrer, e ainda, de qualquer fato do qual resulte a necessidade da execução de obras e reparos indispensáveis à garantia do uso do imóvel rural; fazer no imóvel, durante a vigência do contrato, as benfeitorias úteis e necessárias, salvo convenção em contrário; a devolver o imóvel, ao término do contrato, tal como o recebeu com seus acessórios; salvo as deteriorações naturais ao uso regular.
Além disso, o arrendatário será responsável por qualquer prejuízo resultante do uso predatório, culposo ou doloso, quer em relação à área cultivada, quer em relação às benfeitorias, equipamentos, máquinas, instrumentos de trabalho e quaisquer outros bens a ele cedidos pelo arrendador.
Caso conste do contrato de arrendamento animais de cria, de corte ou de trabalho, cuja forma de restituição não tenha sido expressamente regulada, o arrendatário é obrigado, findo ou rescindido o contrato, a restituí-los em igual número, espécie e valor.
Quando chega ao imóvel, o arrendatário deve permitir que o antigo arrendatário pratique os atos suficientes para ultimar a colheita, de acordo com os usos e costumes do lugar. E ao deixar o imóvel, deve permitir que o novo arrendatário pratique os atos preparatórios para esse fim.
Por último, é de destacar que o arrendatário não poderá subarrendar ou emprestar o imóvel arrendado, sem a expressa anuência do arrendador.
3.2.29. Direitos do arrendador. O arrendador tem o direito de receber os alugueres, bem como de ver cumpridas todas as demais obrigações assumidas pelo arrendatário em relação ao imóvel arrendado.
3.2.30. Direitos do arrendatário. Muitos deles estão previstos na legislação. Outros podem ser convencionados com o arrendador. Os direitos e vantagens previstos na legislação agrária são irrenunciáveis. É necessário que conste cláusula no contrato a esse respeito. Dentre os previstos na lei, podem ser destacados:
3.2.30.1. direito de preempção ou de preferência na renovação do contrato ou na aquisição do imóvel arrendado. Por ocasião da renovação do arrendamento, em igualdade de condições, o arrendatário tem preferência em relação ao estranho. Ocorre de igual modo, na hipótese de compra do imóvel arrendado.
O arrendador que tiver vontade de vender o imóvel arrendado deverá notificar extrajudicialmente o arrendatário, no prazo de trinta dias, para que este possa exercer o seu direito, na forma prevista na legislação agrária. Caso não seja notificado, poderá, depositando o preço no prazo de seis meses a contar da data de transcrição da escritura de compra e venda no Registro de Imóveis, requerer para si o imóvel arrendado;
3.2.30.2. direito de renovar o arrendamento, caso não seja notificado extrajudicialmente pelo arrendador, com sis meses antes de findar o contrato, de que este deseja retomar o imóvel para cultivo direto seu ou de seu descendente.
3.2.30.3. direito de conhecer por meio de Notificação Extrajudicial cópia das propostas de outros interessados em arrendar o imóvel que estiver arrendando. Deve ser notificado com seis meses de antecedência. Caso não seja e, não manifeste nos trinta dias seguintes o seu desejo de extinguir o arrendamento, este se considera renovado;
3.2.30.4. direito de ser indenizado por perdas e danos, no caso de insinceridade comprovada por parte do arrendador, principalmente na renovação ou retomada do imóvel e no tocante às benfeitorias necessárias e úteis que vier a realizar no imóvel arrendado e quanto às voluptuárias, quando sua realização tiver sido expressamente autorizada pelo arrendador
3.2.30.5. Direito de renovar o contrato com os herdeiros não interessados na retomada do imóvel, no caso de sucessão causa mortis.
3.2.30.6. Direito de não ter o contrato interrompido no caso de alienação do imóvel. Nessa situação, o adquirente fica sub-rogado nos direitos e obrigações do alienante.
3.2.30.7. Direito de pactuar a substituição da área arrendada com o arrendador, por outra equivalente, quando serão mantidas as demais cláusulas do contrato.
3.2.30.8. Na desapropriação. No caso de desapropriação parcial do imóvel rural, ficará assegurado ao arrendatário o direito à redução proporcional da renda ou o de rescindir o respectivo contrato.
3.2.31. Partes contratantes: Deve-se dizer quem é o arrendador e quem é arrendatário.
3.2.31.1. Arrendador é o proprietário, posseiro ou detentor; é o que cede ou aluga o imóvel rural. Essa é a idéia que está presente no Decreto nº. 59.666/66, em seus arts. 1º., 9º e 12, III. Em todos esses textos, o Chefe do Poder Executivo Federal, no exercício do seu poder regulamentar diz que as partes são “o proprietário, quem detenha a posse ou tenha a livre administração” ou, mais taxativamente, “os proprietários, usufrutuários, usuários ou possuidores do imóvel rural”.
É de observar, no entanto, que a Lei 4.504/64, à qual o Decreto 59.666/66 diz regulamentar, considera como parte apenas o proprietário. Além disso, é de destacar que a Lei 11.443, de 5 de janeiro de 2007, dando nova redação aos arts. 95 e 96 do Estatuto da Terra, nas diversas vezes em que cita as partes, diz apenas que ao proprietário cabe isso ou aquilo em relação aos contratos agrários, não incluindo nenhum dos outros “legitimados” previstos no Decreto 59.666/66.
Para o doutrinador Benedito Ferreira Marques (11) , o art. 92 do Estatuto da Terra comete uma visível erronia, quando fala apenas em ‘proprietário’ a figurar num dos pólos da relação contratual de que se cuida. [E que] a Lei 11.443, de 5 de janeiro de 2007, inexplicavelmente, manteve a erronia, conferindo legitimidade para ser arrendador apenas ao proprietário.
3.2.31.2. Arrendatário é a pessoa ou conjunto familiar, representado pelo seu chefe que o recebe ou toma por aluguel um imóvel rural para explorá-lo na forma da lei.
É de ver que a matéria apreciada é extremamente técnica e seu exame acaba sendo um tanto árido. Todavia, não seria possível realizar um bom contrato de arrendamento sem antes tomar conhecimento da terminologia específica usada.
Após a leitura e interpretação da legislação aplicada, pode-se concluir que a mesma é muito minuciosa quanto ao trato da matéria, cuidando de atender a cada detalhe, objetivando não somente assegurar os direitos do arrendatário como parte mais fraca na relação jurídica contratual, mas também garantir que a terra possa ser explorada de forma a cumprir com sua função social, o grande norte da concepção que atualmente rege as atividades agrárias no Brasil.
CONCLUSÃO. O arrendamento rural é uma das modalidades típicas de contrato agrário. Não é a única. Existem outras, tanto típica, quanto atípica. De todas, no entanto, com certeza, esta é a que mais absorveu o interesse e o empenho do legislador pátrio. Ele foi minudente. Buscou atender aos mínimos detalhes. É evidente que essa é uma tarefa hercúlea e que dificilmente seria levada a bom termo. Mas, o que se destaca nesse momento é que, ao concluir a análise ora empreendida, percebe-se que houve essa intenção detalhista.
Na vontade de pormenorizar, erros foram cometidos, como por exemplo, a exclusão do usufrutuário, do posseiro e do detentor como legitimados para a celebração do contrato de arrendamento. Erro cometido pelo legislador de 64, quando elaborou o Estatuto da Terra. Erro também cometido pelo legislador do século XXI, quando também manteve apenas o proprietário como legitimado na condição de arrendador, ao fazer a revisão dos arts. 95 e 96 do ET, por meio da Lei nº. 11.443/2007, deixando, inclusive, uma situação anômala, haja vista que o Decreto nº. 59.666/66, que regulamentou o Estatuto, reconhece todos aqueles excluídos como legitimados autênticos. É de destacar que até mesmo a legislação paralela o reconhece, haja vista que se admite aos mesmos a realização de financiamentos para dar suporte financeiro ao desenvolvimento de suas pretensões agrárias, como é o caso da Lei nº. 2.666/55, que trata do o penhor agrícola e que ainda está vigente. Segundo ela, o penhor agrícola pode ser celebrado tanto pelo arrendatário, como pelo comodatário, parceiro, condômino ou pelo usufrutuário, independentemente da anuência do proprietário da propriedade imóvel onde se encontram os bens.
Todavia, o que se conclui de todo a pesquisa realizada é que, apesar de ser um trabalho eminentemente técnico, é de radical necessidade que o operador do Direito empreenda esse esforço. Doutra sorte, também poderia incorrer nas “erronias” e “anomalias”, destacadas pelo doutrinador Benedito Ferreira Marques, em sua obra aqui consultada e referenciada, como ocorreu com os nossos legisladores pátrios.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:
OPTIZ, Sílvia C . B.; OPTIZ, Oswaldo. Curso completo de direito agrário. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
MARQUES, Benedito Ferreira. Direito agrário brasileiro. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2007.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 5.ed. São Paulo: Atlas, 2005, v. 2.
BORGES, Antonino Moura. Curso completo de direito agrário: doutrina, prática, legislação complementar e jurisprudência. 2.ed. Leme (SP): CL EDIJUR, 2007.
COELHO, José Fernando Luiz. Contratos agrários: uma visão neo-agrarista. Curitiba (PR): Juruá, 2008.
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LOPES, Marcelo Dantas in A evolução histórica do contrato. Disponível em: <http://www.lopesadv.com.br/artigo.php?codigo=2>. Acesso em: 19 abr. 2008.
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MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica no direito obrigacional. 2. tir. São Paulo: editora Revista dos Tribunais, 2000.
ANEXO I - MINUTA DE CONTRATO DE ARRENDAMENTO DE UM IMÓVEL RURAL (Exploração Agrícola)
I – DAS PARTES CONTRATANTES
F..., casado ou solteiro (ou pessoa jurídica, constituída por atos de com o capital registrado de com tantos sócios), brasileiro, portador da carteira de identidade n..., fornecida pela Delegacia de Polícia de P..., proprietário, residente à rua tal n... na cidade de P..., denominado neste contrato como arrendador, e F..., casado (ou solteiro, ou conjunto familiar, conforme o caso, sendo que deve constar o número de pessoas que o compõem), brasileiro, portador da carteira de identidade n..., fornecida pela Delegacia de Polícia de P..., residente à rua tal, n..., cidade de P..., denominado arrendatário, convencionam o presente contrato de arrendamento, mediante cláusulas a seguir estipuladas:
II – DAS CLÁUSULAS CONVENCIONADAS
1. FINALIDADE. O presente contrato de arrendamento tem por finalidade a exploração agrícola e plantio de trigo (arroz, feijão etc.).
2. OBJETO. O objeto do presente contrato tem as seguintes características:
2.1. Área registrada. O imóvel objeto de contrato tem a área de 200 hectares, está registrado no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de P..., sob n..., e no INCRA sob n...
2.2. Localização. O imóvel está situado na Comarca de do Município de P..., com as seguintes confrontações: ao norte com terras de João de tal, ao sul com a estrada que liga Carazinho a Sarandi; a leste com as terras de José de tal e a oeste com o Rio Peludo, que serve de divisa com as terras de José de tal;
2.3. Benfeitorias. O imóvel objeto do contrato tem as seguintes benfeitorias: uma casa grande para moradia do arrendatário e sua farm1ia; um galpão de 100 x 100 metros, para depósito dos produtos e das ferramentas; cinco arados com um trator; três juntas de bois (e demais benfeitorias);
2.4. Animais. Ficam incluídos no objeto do arrendamento, vinte animais de cria e quatro juntas de bois, de arado, os quais deverão ser entregues, findo o contrato, em igual número, espécie e valor;
3) PRAZO. O contrato é firmado pelo prazo de três anos, a começar no dia 10 de outubro de 1998, para terminar no mesmo dia e no ano de 2002;
4) PREÇO. O preço do arrendamento, por ano de vigência, é de R$ 20.000,00, sendo R$ 10.000,00 em dinheiro e R$ 10.000,00, em produtos conforme o preço vigorante do mercado e nunca inferior ao fixado pelos órgãos estatais;
5) REAJUSTAMENTO. O presente contrato poderá ter seu preço reajustado, anualmente, desde que se altere o valor do imóvel, de acordo com o índice de correção monetária fornecido pelo Ministério do Planejamento e divulgado pelo INCRA;
6. VEDAÇÕES.
6.1. Cortes e podas. Ficam o arrendatário e seus familiares proibidos ao corte ou podas das árvores frutíferas, ou demais plantações florestais que integram a gleba arrendada, salvo quando forem necessárias e nas épocas devidas ou costumeiras;
6.2. Subarrendamento. O arrendatário não poderá subarrendar, emprestar ou ceder o imóvel, objeto do contrato;
7. DIREITOS DO ARRENDATÁRIO. O arrendatário possui os seguintes direitos, além de outros previstos neste contrato e na legislação agrária e que lhe sejam irrenunciáveis.
7.1. Colheita. O arrendatário fica com o direito de colher o fruto de seu cultivo, inclusive nas seguintes situações:
a) caso não tenha sido possível colher antes de findo o contrato, inclusive plantas forrageiras temporárias que haja cultivado para uso dos animais de serviço da exploração;
b) caso haja retardamento da colheita, por motivo de força maior ou caso fortuito, sem qualquer aumento do preço do arrendamento;
7.2. Direito de Preempção. O direito de preferência do arrendatário se dará nos seguintes casos:
7.2.1. Renovação. O arrendador obrigar-se-á a dar preferência à renovação do arrendamento ao arrendatário, em igualdade de condições com terceiros (estranhos), fazendo a notificação, prévia, no prazo de seis meses antes do término do contrato;
7.2.2. Compra. O arrendatário tem o direito de preferência para a compra do imóvel arrendado, caso o arrendador deseje vendê-lo, devendo ser por este notificado extrajudicialmente, com antecedência de trinta dias para que possa exercer o seu direito, caso deseje.
7.3 Benfeitorias. O arrendatário poderá fazer as benfeitorias necessárias ou úteis, dependendo as voluptuárias de autorização prévia e escrita do arrendador, respondendo este pela indenização daquelas, podendo o arrendatário deter o imóvel, caso isso não seja satisfeito;
7.5 Direito de permanência. O presente contrato vigorará mesmo que ocorra a morte dos contratantes e, no caso de venda ou imposição de ônus real, fica garantida a permanência do arrendatário;
8. OBRIGAÇÕES DO ARRENDATÁRIO. O arrendatário tem, dentre outras obrigações previstas neste contrato e na legislação vigente, as seguintes:
8.1. Manutenção e conservação. O arrendatário obriga-se a manter o imóvel e suas benfeitorias, nas mesmas condições em que os recebeu, sob pena de responder pelos prejuízos causados;
8.2. Pagamento. O preço do arrendamento será feito no domicílio do arrendador dez dias após o vencimento de cada ano de vigência do contrato, mediante recibo;
8.2.1. Penalidades pela falta de pagamento. A falta de pagamento do preço do arrendamento na forma estipulada constituirá em mora o arrendatário e rescindindo o contrato, ressalvado seu direito de purgar a mora, na forma do regulamento baixado pelo Decreto n. 59.566, de 14-11-1966;
8.3. Decorrentes de novos cultivos. Caso o arrendatário queira iniciar qualquer cultura, cujos produtos não possam ser colhidos antes de terminado o prazo do contrato, obrigar-se-á a entrar em entendimento com o arrendador, sob a forma do pagamento do aluguel pelo prazo que exceder e, conforme cláusula supra, a forma de entrega dos produtos, na percentagem estabelecida;
8.4. Recursos naturais. O arrendatário, por si e seus familiares, obriga-se a conservar os recursos naturais existentes no imóvel;
9. OBRIGAÇÕES DO ARRENDADOR. O arrendador se obriga a pagar as taxas, impostos, foros e toda e qualquer contribuição que incida ou venha a incidir sobre o imóvel rural (pode ser o contrário, ficando o arrendatário obrigado por esses encargos, tudo depende da vontade das partes);
III – DISPOSIÇÕES FINAIS
1. VINCULAÇÕES. As partes se comprometem a respeitar as regras que forem ditadas pelo Estatuto da Terra e suas regulamentações atuais e posteriores;
2. DEVOLUÇÃO DO OBJETO. Findo o prazo do contrato, caso não se tenha verificado a renovação ou prorrogação, o arrendatário deixará o imóvel, pendente de notificação, sob pena de despejo;
3. FORO. Fica nomeado o foro do contrato a Comarca de residência e domicílio do arrendador;
E, porque assim as partes concordaram com o presente contrato de arrendamento, em todos seus termos, assinam o presente instrumento, em duas vias, datadas e com a assinatura do fiador.
Lugar e data do contrato. Assinaturas:
Arrendador
Arrendatário
Caso um deles não saiba ou não possa assinar, assinarão quatro testemunhas, a seu rogo.
Testemunhas a rogo:
Notas:
1. O contrato será levado a registro no INCRA, para fins de registro e de crédito. O registro será feito na Agência do INCRA da localidade do imóvel ou do foro de sua execução; caso não haja agência, na mais próxima possível.
2. O contrato de subarrendamento, quando permitido, pode ser feito da mesma maneira, sendo que o arrendatário toma o nome de subarrendador e o outro de subarrendatário. Igualmente, na cessão ou comodato.
3. Se houver fiador, este assinará o contrato e, se casado, também a mulher assina.
_________
NOTAS
1Apud LOPES, Marcelo Dantas in A evolução histórica do contrato. Disponível em:
<http://www.lopesadv.com.br/artigo.php?codigo=2>. Acesso em: 19 abr 2008.
2 WALD, Arnold. apud GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil – Contratos. São Paulo: Saraiva, v. IV, p. 1-2.
3 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 5.ed. São Paulo: Atals, 2005 (Coleção direito civil; v. 2, p. 394).
4 A forma de divisão da Idade Média em períodos para fins didácticos não é consensual. No entanto, a mais comum é a utilizada pelos medievalistas franceses, entre os quais Jacques Le Goff e Georges Duby. Para estes especialistas, a Alta Idade Média corresponde a um período que vai da queda do Império Romano do Ocidente, em 476, até o ano 1000 – após ao qual inicia a Idade Média Clássica. A Baixa Idade Média corresponde ao século e meio que antecede ao Renascimento, ou seja, 1300 a 1450
5 O Código Napoleónico, originalmente chamado de Code Civil des Français, foi o código civil francês outorgado por Napoleão I e que entrou em vigor a 21 de março de 1804. Disponível em <http://www.diario-universal.com/2007/03/aconteceu/o-codigo-napoleonico/>. Acesso em 19 abr 2008.
6 SHILLING, Voltaire. Napoleão e as partes do código. Disponível em: <http://educaterra.terra.com.br/voltaire/mundo/2003/06/24/000.htm>. Acesso em 19 abr 2008.
7 DALL`ALBA, Felipe Camilo. Os três pilares do Código Civil de 1916: a família, a propriedade e o contrato. Disponível em: <http://www.tex.pro.br/wwwroot/02de2004/ostrespilares_felipecamilo.htm>. Acesso em 19 abr 2008.
8 RAMOS, Guerreiro. Introdução crítica à sociologia brasileira. Rio de Janeiro: Ed. Andes, 1957, p. 27-28.
9 MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica no direito obrigacional. 2. tir. São Paulo: editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 256.
10 BORGES, Antonio Moura. Curso completo de direito agrário. 2.ed. Leme (SP): CL EDIJUR, 2007, p. 111.
11Idem, p. 176.
Prof Izaias Resplandes
Enviado por Prof Izaias Resplandes em 07/09/2008
Alterado em 13/09/2014