A Matemática Jurídica das eleições no Brasil
Introdução. O Brasil é um país democrático, onde o poder uno é tripartido em Executivo, Legislativo e Judiciário. A cada dois anos realizam-se eleições para renovar os quadros políticos dos poderes Executivo e Legislativo. O Judiciário ainda não se utiliza do sufrágio popular para preencher seus postos de comando. Seus dirigentes são eleitos por seus próprios pares. Em todos os casos, há predominância do voto secreto, com destaque para dois sistemas de eleições: o majoritário e o proporcional. Ambos são regulados pelo Código Eleitoral, aprovado pela Lei 9.504, de 30 de setembro de 1997 e alterado por diversas leis esparsas.
As eleições no Brasil se realizam no primeiro domingo de outubro, em primeiro turno e, no último domingo do mesmo mês, em segundo turno, onde houver. Em princípio foi fixado um dia do mês. No modelo atual preferiu-se o dia da semana. Domingo, um dia em que todos estão disponíveis para comparecer aos locais de votação e assim participar desse exercício de civilidade, de suma importância para a manutenção da alternância democrática no poder.
A Matemática é a ciência dos objetos ideais. Consiste em um conjunto de ferramentas posto à disposição dos interessados para uma melhor compreensão dos diversos processos de construção do conhecimento. O processo eleitoral, tema jurídico de suma importância, ainda é pouco conhecido, principalmente no que diz respeito aos diversos cálculos matemáticos que requer para sua boa assimilação. O presente artigo objetiva oferecer esclarecimentos sobre a utilização das ferramentas de cálculo para a compreensão dos processos jurídicos eleitorais majoritários e proporcionais.
1. Eleições majoritárias. São chamadas majoritárias, as eleições para Presidente da República, Senador da República, Governador de Estado, Governador Distrital e Prefeito de Município. Segundo esse modelo, há uma diferença entre as eleições para Presidente ou Governador e as eleições para Prefeito.
O Presidente e os Governadores são eleitos, em princípio, pelo voto da maioria absoluta dos eleitores, não computados os votos em branco e os nulos. São considerados apenas os votos válidos. A maioria absoluta é o critério que leva em consideração o total dos eleitores qualificados para a votação. É eleito o candidato que conseguir um número de votos maior ou igual ao primeiro inteiro superior à metade do total de eleitores qualificados para votar. Exemplo: Havendo 10.001 eleitores, estará eleito o candidato que obtiver 5001 ou mais votos ao seu favor. Não é a metade mais um. Se assim fosse seriam 5001 e meio, o que não é possível.
Haverá segundo turno eleitoral, ou seja, uma nova eleição, sempre que nenhum dos candidatos obtiver a maioria absoluta dos votos na primeira votação, o qual ocorrerá no último domingo de outubro. Desta nova disputa participarão apenas os dois candidatos mais votados em primeiro turno. Neste caso prevalece o critério da maioria simples.
Nas eleições para Prefeito também vigora o critério da maioria simples. São considerados apenas os eleitores votantes. Será eleito o candidato que conseguir um número de votos maior ou igual ao primeiro inteiro superior à metade do total de eleitores votantes. Exemplo: Se mil e um eleitores votaram, está eleito o candidato que obtiver 501 ou mais votos ao seu favor. É de destacar que nos municípios com mais de 200 mil eleitores qualificados, também serão adotadas as mesmas regras das eleições para Presidente e Governador, ou seja, os critérios da maioria absoluta e do segundo turno.
As eleições para Presidente, Governador e Prefeito acontecem de quatro em quatro anos, conforme os arts. 82, 28 e 29, II da CF/88.
2. Eleições Proporcionais. Esse é o sistema utilizado nas eleições para vereador, deputado estadual e deputado federal. Baseia-se no critério da proporcionalidade. A definição dos eleitos é proporcional ao número de votos obtidos pelos partidos ou coligações. Entende-se por coligação um grupo de partidos que se une para disputar as eleições.
A definição dos eleitos segue uma boa matemática elementar, envolvendo as operações fundamentais de adição, subtração, multiplicação e divisão. Há certa complexidade no assunto, o que torna o sistema ainda mais interessante. Muitas vezes são eleitos determinados candidatos com bem poucos votos, enquanto que outros, com muitos votos não conseguem se eleger. É importante que o candidato esteja em uma coligação com pessoas “boas” de voto.
O método tem início com a definição do quociente eleitoral. Esse índice é resulta da divisão entre o número de votos válidos obtidos nas eleições por todos os candidatos e o total de vagas a serem preenchidas. Para exemplificar, vamos considerar as eleições proporcionais para Vereador, durante o processo eleitoral ocorrido em 2004 no município de Poxoréo, MT, localizado a 250 km da capital do Estado, Cuiabá, hoje com 14.210 eleitores inscritos. Naquele tempo, o topônimo do município ainda era grafado com “o”. Hoje é grafado com “u” – Poxoréu. Naquele ano, 10.711 pessoas compareceram às urnas. No entanto, houve apenas 10.327 votos válidos, haja vista que 125 votaram em branco e 259 anularam seus votos. O voto é nulo quando o eleitor digita um número inexistente e confirma. Como em Poxoréo havia 9 vagas na Câmara, o quociente eleitoral resultou da seguinte operação matemática: 10327: 9 = 1.147,44.
O segundo passo no sistema proporcional é a definição do quociente partidário, o qual é obtido através da divisão entre o número de votos válidos recebidos pelo partido ou coligação e o quociente eleitoral. Fica excluído da divisão das vagas, os partidos ou coligações que não conseguirem obter votos em número igual ou superior ao quociente eleitoral. Foi o que aconteceu, por exemplo, com a coligação FST, em Poxoréu, no ano de 2004, levando o candidato Sebastião Alves da Silva, com 387 votos, a não se eleger, embora Osmar Resplande de Carvalho, com apenas 334 votos tenha se elegido.
Em 2004, as eleições no município de Poxoréo apresentaram, em resumo, os seguintes números: FSP (Frente Social Progressista): 2727 votos; FST (Frente Social Trabalhista): 910 votos; UPP–A (Unidos por Poxoréo A): 3685 votos; UPP-B (Unidos por Poxoréo B):: 3005 votos; Brancos: 125; Nulos: 259; Total de Votos Válidos: 10327. Como o quociente eleitoral foi de 1.147,44 votos, a coligação FST que obteve apenas 910 votos, não elegeu nenhum vereador. As vagas foram disputadas apenas pelas demais coligações, as quais tiveram os seguintes quocientes partidários: FSP: 2727 : 1.147,44 = 2,376594855; UPP-A: 3685 : 1.147,44 = 3,211496897; e, UPP-B: 3005 : 1.147,44 = 2,618873318. Despreza-se a parte decimal. A parte inteira do quociente representa o número de vagas preenchidas por cada unidade em disputa.
Assim foram distribuídas as primeiras sete vagas: FSP: 2 vagas, ocupadas pelos candidatos Antônio Lélis – 499 votos e Jailton Costa – 374 votos; UPP-A: 3 vagas, ocupadas por Alcebíades Nunes – 463 votos; Miguel David – 437 votos e José Correia – 424 votos; e UPP-B: 2 vagas, com João de Jesus Baco-Baco – 457 votos; João Joaquim JJ – 340 votos. Ficaram duas vagas remanescentes, as quais foram preenchidas através do cálculo de médias.
A distribuição das sobras de vagas, como é chamada é feita a partir do cálculo de médias. Divide-se o somatório dos votos atribuídos aos candidatos do partido ou coligação pelo número de vagas feitas pelo grupo na distribuição das vagas, acrescido de uma unidade. Exemplificando. A coligação FSP obteve 2.727 votos e fez 2 vagas na distribuição inicial. Então, nas sobras, dividir-se-á 2727 por 3, ou seja, por 2 vagas + 1. Dessa forma, a distribuição das sobras teve as seguintes conseqüências: FSP: 2727 : 3 = 909; UPP-A: 3685 : 4 = 921,25; UPP-B: 3005 : 3 = 1001,666666. A maior média foi da UPP-B, a qual elegeu mais um vereador: Osmar Resplande – 334 votos. A última vaga seguiu critério idêntico, alterando agora a média da UPP-B. Assim ficaram os números: FSP: 2727 : 3 = 909; UPP-A: 3685 : 4 = 921,25; e UPP-B: 3005 : 751,25. A maior média foi da UPP-A, a qual elegeu o último vereador: Nilton Alves Rodrigues – BISA – 351 votos.
Conclusão. Essa é a matemática das eleições. É coisa que não se costuma ensinar em sala de aula. Isso não se deve apenas à complexidade dos cálculos, mas principalmente à resistência aos temas políticos. Há uma crença estúpida de que não se deve falar sobre política em certos lugares como na escola ou na igreja. Isso é um absurdo. Tanto a Escola quanto a Igreja, são centros de educação por excelência, nas quais se deve ensinar tudo o que as pessoas efetivamente precisam aprender. É evidente que esses não são locais para a realização de campanhas político-partidárias. Mas não se pode subtrair deles o status de tribuna educativa. Sendo conduzidas de forma responsável, a temática pode ser explorada com grandes resultados, conforme tivemos a oportunidade de verificar em aulas ministradas aos alunos do 2º ano da EE. Pe. César Albisetti e EE Profª Juracy Macêdo, em Poxoréu, MT. Houve muito interesse e participação por parte dos alunos, sendo o processo acompanhado por professores convidados. Entendemos que este é um dos assuntos que podem melhorar o interesse do corpo discente pelas aulas de matemática, normalmente consideradas pedantes e tradicionais, além de possibilitar uma melhor compreensão das questões inerentes ao exercício da cidadania no regime democrático.
REFÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Código Eleitoral. Código Eleitoral. Brasília: Senado Federal, 1997.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.
BRASIL. Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina. Eleições proporcionais: critérios. Disponível em: <http://www.tre-sc.gov.br/site/eleicoes/eleicoes-proporcionais-criterios/index.html>. Acesso em 04 out. 2008.
BRASIL. Tribunal Regional Eleitoral. Informações eleitorais 2008: eleitorado dos municípios. Disponível em:<http://www.tre-mt.gov.br>. Acesso em: 04 out. 2008.
ELEIÇÕES e sistemas eleitorais. Disponível em: <http://www.renascebrasil.com.br/f_eleicoes2.htm>. Acesso em: 04 out. 2008.
Prof Izaias Resplandes
Enviado por Prof Izaias Resplandes em 04/10/2008